O ponto de partida de US$ 1 milhão (aproximadamente R$ 2,2 milhões) por morte ancora a fórmula de compensação para as famílias das pessoas que morreram vítimas de acidentes causados por um comutador de ignição defeituoso em carros da General Motors.
O plano, anunciado pelo especialista em compensação Kenneth Feinberg, é amplo e inclusivo, e parece destinado a abarcar outras mortes além das 13 que a GM vinculou publicamente ao defeito.
Não existe limitação para o dinheiro que a GM concordou em pagar às vítimas, disse Feinberg, e a companhia não invocará sua proteção contra responsabilidade judicial por acidentes ocorridos antes de 10 de julho de 2009, data do acordo de reestruturação que ela assinou depois de uma concordata.
Sob a fórmula de Feinberg, as famílias de vítimas fatais terão direito a pelo menos US$ 1 milhão em compensação, e a esse montante será somado o valor de um cálculo quanto à renda de trabalho perdida, bem como US$ 300 mil adicionais por cônjuge e dependente.
Em um exemplo hipotético oferecido por Feinberg em entrevista, a família de uma mulher casada, com 25 anos de idade e dois filhos, e renda anual de US$ 46,4 mil no momento do acidente, receberia US$ 4 milhões.
Pessoas que tenham sofrido ferimentos catastróficos, causadores de mudanças radicais em suas vidas, podem receber substancialmente mais. Uma criança que tenha ficado paraplégica como resultado de um acidente poderia receber compensação da ordem das dezenas de milhões de dólares, ele disse, com base nos benefícios de um plano médico vitalício, perda de capacidade de trabalho e outros fatores.
O protocolo geral, que oferece compensação até mesmo por acidentes que ainda não tenham acontecido (ele abarca vítimas de acidentes acontecidos até 31 de dezembro de 2014), pode ter pesados custos financeiros para a montadora – possivelmente da ordem de dezenas de bilhões de dólares -, mas é um passo importante para a restauração da confiança do público.
A presidente-executiva da GM, Mary Barra, disse que compensar as vítimas era o “dever cívico” da companhia.
“Estamos satisfeitos por Feinberg ter concluído o próximo passo em nosso programa de compensação para as vítimas de acidentes causados pelo comutador de ignição, a fim de ajudar as vítimas e suas famílias”, afirmou Barra em comunicado. “Estamos assumindo a responsabilidade pelo acontecido, ao tratarmos as vítimas com compaixão, decência e equanimidade. Para esse fim, nossa expectativa é de que Feinberg cuide das reivindicações da maneira mais justa e mais rápida possível”.
Ao determinar quem é elegível para pagamentos, Feinberg desenvolveu critérios mais flexíveis do que aqueles que a companhia vinha usando para determinar vítimas. Por exemplo, vítimas de colisões com impactos traseiros e laterais são potencialmente elegíveis para compensação, segundo ele.
As reivindicações podem ser apresentadas de 1º de agosto a 31 de dezembro, e os primeiros cheques devem ser encaminhados aos beneficiários no quarto trimestre; Feinberg e sua equipe declararam que sua esperança era concluir todos os pagamentos até a metade do ano que vem.
Esse elemento de rapidez e certeza, espera a GM, fará que com as vítimas busquem compensação por meio do programa comandado por Feinberg, de preferência aos tribunais. Mas, em gesto em direção aos advogados de defesa com os quais conversou ao desenvolver os planos, Feinberg disse que as vítimas não teriam de abrir mão de seu direito de recorrer à Justiça para solicitar indenização.
Elas só teriam de se comprometer a não recorrer à Justiça caso recebam pagamentos.
“Por que um solicitante não teria direito a abrir um processo?”, declarou Feinberg em entrevista antes do anúncio. “O solicitante pode determinar primeiro sua elegibilidade e só se decidir que aceitará o cheque de compensação ele precisa assumir o compromisso de abrir mão do direito de processar”.
Mesmo assim, o plano certamente será alvo de muitas críticas.
“As pessoas podem sentir um ceticismo compreensível”, disse Feinberg. “A única maneira de resolver o problema é pagar rápida e generosamente os acordos. Não há o que substitua um pagamento rápido”.
Há dois determinantes fixos de elegibilidade.
A colisão precisa envolver um dos modelos de automóveis para os quais a montadora convocou recalls para a substituição dos comutadores defeituosos, o que inclui o Chevrolet Cobalt, Saturn Ion e outros. Uma lista completa está disponível no site do programa de compensação.
O comutador defeituoso podia desligar subitamente a energia de um carro em movimento, desativando airbags e outros recursos de segurança como a direção hidráulica e os freios. Se os airbags do veículo tiverem sido acionados e se os cintos de segurança tiverem se travado automaticamente, isso significa que a energia estava ligada e que a culpa do defeito não cabia à ignição defeituosa.
Mas Feinberg disse que aceitaria provas menos completas do que um registro eletrônico definitivo, quanto às falhas de airbags, e que trabalharia com os queixosos para ajudá-los a encontrar provas.
Entre as possibilidades, ele disse, estão relatórios policiais, depoimentos de testemunhas, fotos, relatórios de hospital, reivindicações de seguros e até registros de garantia e manutenção que demonstrem que o veículo tinha um histórico de desligamentos involuntários.
As famílias podem optar por uma revisão diferente se acreditam ter sofrido circunstâncias excepcionais que requeiram compensação mais alta, disse Feinberg.
A GM reconheceu que engenheiros e outros funcionários da empresa estavam cientes do problema já em 2001, mas que só neste ano ela revelou a questão e fez um recall de 2,6 milhões de veículos.
Feinberg disse que a GM enviaria notificações sobre o plano de compensação a todos os atuais e passados donos dos carros sujeitos a recall cujos dados ela tivesse, bem como a qualquer pessoa que tenha contatado a empresa sobre um acidente quanto ao qual haja suspeitas de que tenha sido causado por um defeito no carro.
O plano de compensação define pagamentos para aqueles que tenham sido tratados por lesões menos severas, entre os quais pessoas que tenham se recuperado plenamente. Qualquer pessoa tratada em um hospital ou ambulatório até 48 horas depois de um acidente é elegível para apresentar reivindicação.
Para que essas reivindicações sejam aceitas, a fórmula é US$ 20 mil por uma noite de internação, US$ 70 mil por dois a sete dias de internação; US$ 170 mil por oito a 15 dias; até um máximo de US$ 500 mil por 32 ou mais dias de internação. As pessoas tratadas em ambulatório podem receber um máximo de US$ 20 mil.
Feinberg, que supervisionou as verbas de compensação às vítimas dos ataques terroristas do 11 de setembro e do atentado contra a maratona de Boston, disse ter consultado diversos executivos da GM, entre os quais Barra, e que havia dialogado também com militantes da segurança automobilística e com os advogados de numerosas das vítimas.
Um dos maiores problemas, disse ele, é que muitas das colisões aconteceram anos atrás. “O carro não estará mais em posse do então proprietário. Muitos dos registros também terão desaparecido. Teremos de reconstruir o acontecido 10 anos atrás”, ele disse. Mas, acrescentou Feinberg, “faremos tudo que pudermos, e mais, para trabalhar com as pessoas”
Fonte: Folha Online