Para um advogado, o que mais prejudica é a desvinculação do benefício do mínimo
As reivindicações dos aposentados são muitas e se dividem em várias questões que frequentemente vão parar no Judiciário. Mas no fim das contas, o problema é um só: o que se ganha nunca é o mesmo que se contribui. Ao longo da história da Previdência no país houve muitas fórmulas de correção e cálculo dos benefícios, mas nenhuma garantiu aos segurados receber o que pagavam.
“A pior fórmula de cálculo até hoje é a do fator previdenciário, que reduz os ganhos dos aposentados em até 40%. É pior do que antigamente, quando era feita uma média das últimas 36 contribuições”, afirma Yedda Gaspar, presidenta da Federação das Associações de Aposentados e Pensionistas do Rio (Faaperj).
O fator foi aprovado em 1999, como parte da reforma da Previdência Social iniciada no ano anterior. O cálculo considera o tempo de contribuição, a alíquota e a expectativa de vida do segurado no momento da concessão do benefício. Na prática, reduz o valor da aposentadoria para quem se aposenta mais cedo.
Uma alternativa a este cálculo, a Fórmula 85/95 depende agora apenas da aprovação da presidenta Dilma Rousseff (saiba mais na Coluna do Aposentado).
Há ainda o problema da correção dos benefícios com valor acima de um salário mínimo (R$ 788), que atualmente é feita pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). A crítica é que o reajuste fica menor que o do salário mínimo nacional, em que o aumento é baseado no INPC, mais o PIB de dois anos antes.
Para o advogado da Faaperj, João Gilberto Araújo Pontes, o que mais prejudica os aposentados hoje é a desvinculação do benefício do mínimo. “Ao longo do tempo o benefício se desvaloriza muito e esse cálculo é a principal causa das perdas”, explica. Já houve pedidos para mudar essa situação, mas foram todos negados pela Justiça.
Mário Moura Gomes, 79 anos, aposentado desde 1985, é um dos exemplos de trabalhadores que apesar de contribuírem com valores altos à Previdência, hoje recebem menos da metade. “Eu contribuía com 18 salários mínimos, depois reduzi para 12 porque me disseram que não valia a pena pagar tanto, mas me aposentei com apenas 7,6 salários. Hoje, recebo três”, lamenta.
A sensação é de revolta também entre os amigos Benito Passos (79), Arturo Banzaz Illodo (79), Manuel Mouro Costa (83), José Maria Juarez (80), José Antônio Basante (81) e Manoel Martinez (87). “Nem adianta entrar na Justiça. Não existe respeito com os aposentados”, desabafa Benito.
Manuel Francisco Lopes, 86 anos, espera até hoje o resultado de uma ação na Justiça: “Pedi revisão da aposentadoria e ganhei, mas ainda não recebi nada”.
Busca por direitos é importante, mas exige cuidados
Há casos em que idosos têm direito à revisão da aposentadoria, com chances reais de ganho na Justiça, mas é preciso cuidado para não cair no conto do vigário. O ideal é buscar orientação de entidades representativas ou advogados de confiança. Jamais confiar em profissionais que fazem abordagem nas ruas ou por cartas.
Para Yedda Gaspar, presidenta da Faaperj, a categoria não pode ficar parada e deve correr atrás dos seus direitos. “Temos uma força grande no Rio de Janeiro, graças à nossa mobilização. Por isso conseguimos conquistar direitos que em outros estados as pessoas nem sabem que têm”, diz. Especialista em Direito Previdenciário, Pedro Luciano Dornelles afirma que o Sul e o Sudeste têm um histórico de conquistas importantes para os aposentados na Justiça. “As discussões acerca destes assuntos sempre se iniciam aqui, que é onde estão os sindicatos e associações fortes. No Norte e no Nordeste é mais difícil”, explica.
AÇÕES QUE TÊM POUCAS CHANCES DE OBTER GANHOS
Mesmo que pareçam justas, algumas questões dificilmente têm decisão favorável aos aposentados
SALÁRIO MÍNIMO
Hoje, o reajuste dos aposentados que recebem acima do salário mínimo é feito com base no INPC, um índice de inflação. A categoria luta para receber os mesmos índices de reajuste do mínimo, que são o INPC, mais o PIB dos últimos dois anos. “Isso já foi derrubado pelo Supremo”, diz Pedro Dornelles, especialista em Direito Previdenciário. “Tem pessoas que se aposentam com três salários e hoje ganham um. Essa é a principal causa das perdas”, avalia o advogado da Faaperj, João Gilberto Pontes.
REVISÃO
Antes de 1988 as aposentadorias eram corrigidas com base nas Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional (ORTN). Quem recebeu benefício nessa época pode ter tido prejuízo, mas segundo Pontes, é muito difícil conseguir a revisão da aposentadoria na Justiça.
BURACO NEGRO
Com a promulgação da Constituição Federal, em 1988, o indicador ORTN parou de ser utilizado. E até 1991, a aposentadoria não teve parâmetro de reajuste. Há diversos casos de aposentados que tiveram prejuízo com isso, mas mesmo entrando na Justiça não conseguem recuperar as perdas. O caso ficou conhecido como ‘Buraco Negro’.
BURACO VERDE
Em 1991 foi criada uma nova fórmula de correção dos benefícios, mas não era suficiente para cobrir a inflação. Segundo Pontes, houve ações na Justiça para tentar recuperar essas perdas, mas não foram conseguidas decisões favoráveis aos aposentados. Em referência ao buraco negro, o caso foi apelidado de buraco verde.
NOVO ÍNDICE
Atualmente, os aposentados e pensionistas do INSS reivindicam na Justiça que a correção dos benefícios seja feita pelo IGP-DI (Índice Geral de Preços — Disponibilidade Interna), o que reverteria as perdas que a categoria tem com o reajuste pelo INPC, índice usado atualmente. “Mas o Supremo decidiu manter do jeito que está”, afirma Pontes, da Faaperj.
AÇÕES COM MAIS CHANCES DE OBTER GANHO NA JUSTIÇA
Confira as causas que, segundo advogados, têm mais decisões favoráveis aos aposentados
PERDAS POR INVALIDEZ
Advogado da Faaperj, João Gilberto Araújo Pontes explica que foram reconhecidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) perdas sofridas por quem se aposentava por invalidez. No entanto, o INSS estabeleceu que o pagamento dessa diferença seria feito apenas em 2020, por falta de receita. Segundo o advogado, quem entra na Justiça consegue antecipar esse pagamento.
ATIVIDADE ESPECIAL
Advogado especializado em Direito Previdenciário, Pedro Dornelles afirma que já está pacificada a conversão do tempo da atividade especial para quem recebe insalubridade ou periculosidade. Ou seja, a cada 10 anos trabalhando em atividade especial a pessoa consegue descontar quatro anos para a aposentadoria. “Além disso, quem fecha 25 anos de serviço na especial consegue ter aposentadoria integral, sem o fator previdenciário”, avisa.
URV
Quem teve aposentadoria concedida entre março de 1994 e fevereiro de 1997 tem direito à revisão do benefício, que tinha como fator de reajuste a URV (Unidade Real de Valor). Segundo Pontes, o INSS chegou a pagar a diferença, mas alguns não receberam.
DUPLA CONTRIBUIÇÃO
Para quem tem dois empregos, o fator previdenciário só deve ser aplicado na primeira atividade, de acordo com Dornelles. “Na atividade secundária (com menos tempo de serviço) não incide fator. O aposentado pode entrar na Justiça”, afirma.
EMENDA 40
Após a Emenda Constitucional 40, de 2003, trabalhadores que contribuíam para a Previdência pelo teto tiveram perdas. O erro foi reconhecido pelo INSS, mas o STF só autorizou o pagamento da correção a quem se aposentou a partir de 1991. Para o advogado João Gilberto Araújo Pontes, aqueles que tiveram benefício concedido antes desse ano podem recorrer na Justiça. Mas só recebem o valor retroativo aos últimos cinco anos.
Fonte: O Dia Online