São poucos os que se sentem realmente felizes com sua vida profissional. Pesquisa realizada pela Isma Brasil (International Stress Management Association) no ano passado revela que 72% dos entrevistados estão insatisfeitos com o trabalho.
Se pudesse contemplar esse percentual, o psicanalista Sigmund Freud, autor de “O Mal-Estar na Civilização”, não se surpreenderia, já que, para ele, “a grande maioria das pessoas só trabalha sob pressão da necessidade”.
Estudiosos da psicologia positiva (vertente que estuda a felicidade em vez dos traumas e das doenças mentais), porém, têm outra visão.
Para eles, a felicidade tem mais a ver com uma visão de mundo do que com um objetivo a ser alcançado. Ou seja, se você olhar para os eventos cotidianos com mais otimismo, será mais feliz -no trabalho e na vida.
Shawn Achor, psicólogo que trabalhou em Harvard durante 20 anos, vem mostrando com pesquisas empíricas que pessoas que veem a “metade cheia do copo” são não apenas mais felizes, mas mais produtivas e têm mais chances de serem bem-sucedidas do que colegas reclamões e estressados.
Achor afirma que você pode treinar o cérebro a ser positivo da mesma maneira que treina os músculos.
Ele sugere cinco atividades: meditar, fazer exercícios, agradecer diariamente, fazer coisas boas gratuitamente e manter um diário de experiências positivas.
Em 2008, o psicólogo pesquisou um grupo de auditores fiscais e propôs que eles escolhessem uma dessas atividades para praticar durante um período de 21 dias.
Quatro meses depois, o índice de bem-estar foi de 27,23 (em uma escala de 35 pontos), ante 22,96 antes do treinamento (aumento de 12,2%). Para ele, um sinal de que a felicidade virou hábito.
A presidente da Isma Brasil, Ana Maria Rossi, explica que a infelicidade dos brasileiros no trabalho tem relação com falta de reconhecimento (89%), excesso de tarefas (78%) e problemas de relacionamento (63%).
No entanto, ela observa que as pessoas costumam focar no que elas não têm e não gostam. “À medida que você se posiciona sempre de maneira negativa, você cria uma trilha neurológica de falta de satisfação e de infelicidade”.
SER FELIZ VIROU NEGÓCIO
A Acesso Digital começou, no ano passado, a fazer um treinamento baseado na psicologia positiva e propôs a 60 de seus funcionários que fizessem o exercício sugerido por Achor.
A relações públicas Carolina Genovesi Gomes, 29, gostou tanto do treinamento que manteve o hábito de agradecer diariamente. E defende: isso lhe dá leveza na vida, mesmo em situações tristes.
“Quando fazemos esse exercício, nos tornamos protagonistas da própria vida. Não deixamos a nossa felicidade depender dos outros, pois ela depende de como encaramos o dia a dia”, afirma.
Há dez anos, Paulo Maurício Mello, 57, era um dos insatisfeitos com o trabalho, mesmo sendo um executivo bem-sucedido.
Ele trabalhava em uma empresa de telecomunicação e ficava chateado com a “falta de ética e a corrupção”. Abriu sua própria empresa, mas seguia infeliz.
Aos 38 anos, ele tomava comprimidos e meia garrafa de uísque por dia. Foi quando seu corpo reclamou. “Fui um dia levantar da cama e não consegui, minhas pernas não se mexiam”.
Ficou dez meses de cama, em depressão profunda, e buscou terapia para saber a origem da sua insatisfação.
Depois do tratamento, Mello tornou-se sócio de uma empresa de informática e, paralelamente, atendia seus amigos e colegas em um coaching informal.
Em 2005, decidiu que ia investir no aconselhamento. Desenvolveu um método próprio de coaching, começou a dar palestras e abriu uma empresa: o Núcleo Pluri, que integra terapia, coaching e tratamentos de saúde.
“As pessoas sempre tentam achar um culpado para seus problemas. Ajudo a fazer com que elas aceitem suas imperfeições. Fazemos escolhas diárias, como se aborrecer ou não com um determinado evento”, diz Mello.
AMBIENTE FELIZ
O ambiente também é crucial para a realização profissional. Ter amigos no escritório e trabalhar em um local amigável e afetuoso aumentam os níveis de satisfação no trabalho.
Estudo desenvolvido pelas professoras de administração Sigal Barsade e Mandy O’Neill em sete indústrias constata que uma cultura empresarial onde há o que chamam de amor companheiro gera mais satisfação no trabalho e dedicação à empresa.
Este tipo de ambiente, onde os colegas demonstram sentimentos de afeição, compaixão, carinho e ternura, precisa ser promovido inicialmente pelos líderes, defendem. Com o tempo, essa cultura se dissemina naturalmente.
Para Marcel Spadoto, sócio da Opportunity Consulting, no mundo corporativo, a regra geral é do individualismo: cada um tenta fazer a sua parte e alcançar suas metas.
“As empresas pregam que cada funcionário tem que ser mais produtivo do que o outro. Mais produtivo será unir metas na equipe e colocá-los para trabalhar de maneira colaborativa, como em um time de futebol”, diz Spadoto.
Mesmo o cético Freud contempla, em uma nota de rodapé de sua obra, a possibilidade de se encontrar satisfação profissional “se [o trabalho] for livremente escolhido”.
Fonte: Folha Online