A operadora de planos de saúde Saúde Assistência Médica Internacional protocolou, no Banco Central, na última sexta-feira (27/9), pedido de instauração de procedimento administrativo investigativo contra o Itaú Unibanco por irregularidades na prestação de serviços bancários. A operadora acusa a instituição de ter autorizado movimentação de conta e evasão de recursos financeiros sem autorização de correntista, desvio de finalidade de cheques e ordem de débito e recusa no fornecimento de extratos, microfilmagem de títulos e cartas de autorização ao cliente.
Em março, a assistência médica acusou o banco de fraude e atos ilegais em débitos efetuados por pessoas não autorizadas. A operadora tinha ajuizado ação indenizatória com pedido de antecipação de tutela no valor de R$ 37,4 milhões, alegando extrema necessidade para garantir a sobrevivência da empresa no mercado. O banco apresentou contestação, apontando ilegitimidade passiva e prescrição do direito. Reconheceu ter havido a fraude, mas garantiu não ter sido responsável por ela.
Segundo o banco, o autor das irregularidades foi um antigo consultor da operadora de planos de saúde. Portanto, não poderia ser responsabilizado pelo ato. “Ao invés de responsabilizar os indivíduos que lhe causaram o real prejuízo, prefere se arriscar numa aventura jurídica pretendendo que o banco a indenize por todos os males que lhe foram causados em quase dez anos”, afirmou na contestação, em relação à Saúde Internacional.
A ação chegou ao Tribunal de Justiça de São Paulo em recurso de agravo com pedido de antecipação de tutela feito pela operadora. O relator, desembargador Franco de Godoi, disse que ainda precisava de prova pericial para analisar o mérito e os autos voltaram para a primeira instância na 17ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo. Agora, as partes aguardam o despacho que irá definir os pontos controvertidos, determinar o início de produção de provas e marcar audiência de conciliação.
LAUDO PERICIAL
Em junho deste ano, o Itaú Unibanco apresentou um laudo pericial feito pela empresa Ebrape, sobre a movimentação das contas bancárias da Saúde Internacional. O laudo extrajudicial esclareceu três principais pontos das acusações.
Em relação à acusação de indevida permissão de saques, o laudo diz que a instituição tinha confiança no cliente e que, por isso, fazia a quitação dos compromissos da empresa antes de confirmar a existência de saldo em conta corrente para honrar o cheque correspondente.
Quanto ao pagamento de funcionários, a acusação é de que há vários débitos em contas correntes dos quais a Saúde Interncaional não sabe a origem e nem a destinação, feitos por pessoas não autorizadas. Já o laudo concluiu que a empresa fez a acusação sem analisar devidamente os destinos dos débitos e sem comprovar de forma efetiva essas irregularidades. O laudo questionou ainda a perícia unilateral que foi apresentada pela operadora e disse que tal perícia tirou conclusões usando metodologia simplista, sem fazer auditoria na totalidade dos registros contábeis.
Outra acusação da operadora foi em relação a despesas que não fazem parte da atividade da empresa. Sobre isso, o laudo afirmou que correspondem ao pagamento de cheques regularmente emitidos pela operadora, “inexistindo qualquer impedimento à instituição para que fizesse o pagamento dos documentos”. Ainda segundo o laudo, se os cheques correspondem a despesas que não fazem parte da atividade da empresa, não cabe à instituição do banco a análise, já que a instituição financeira deve apenas promover o pagamento dos cheques devidamente apresentados.
Mas, segundo o advogado Fernando Bianchi, o laudo causou efeito adverso, produzindo prova contra o próprio banco, já que traz anexos que comprovam a compensação de cheques sem assinatura, assim como outras irregularidades. A maior delas foi quanto às explicações sobre o pagamento de cheques sem fundos correspondentes, segundo manifestação do advogado juntada ao processo. “Nem o mais tolo dos tolos pode conceber que uma instituição financeira disponha de recursos próprios para pagar contas de seus clientes”, diz.
O advogado disse ainda que o trabalho pericial apresentado na inicial e contestado pelo laudo da Ebrape só foi requisitado porque o banco impediu o acesso aos documentos bancários a que a operadora tinha direito. “As conclusões apontadas foram fruto do melhor trabalho possível, afinal de contas, não havia como consultar extratos, microfilmes de cheque e outros documentos bancários que não existem”, disse, na manifestação.
O CASO
A relação com o banco começou em 1999, quando foram abertas várias contas-correntes no Unibanco – hoje Itaú Unibanco -, que tiveram movimento intenso até 2007, com pagamentos a prestadores de serviços e recebimentos de mensalidades pagas pelos clientes de planos de saúde.
Pelo fato de a empresa exercer um papel fundamental na prestação de assistência médica à população e por estar sujeita às Leis 9.656/1998 e 9.961/2000, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) começou a intervir, não só no âmbito fiscalizador, mas também legislador da empresa que, segundo a inicial, apresentava suspeitas de problemas financeiros. Após visita técnica da ANS, em 2008, foram descobertos grandes desvios por meio do sistema bancário. Como consequência, foi interposto um processo criminal contra o gestor da operadora à época da fraude. Além disso, foram solicitados ao Unibanco extratos, microfilmagens de cheques, cartas de autorização de débito e borderôs autorizadores de operações bancárias, entre outros documentos.
Segundo o advogado Fernando Bianchi, o Unibanco forneceu alguns documentos, entre eles cheques microfilmados, em que “foi verificado que houve permissão de compensação de cheques assinados por pessoas não autorizadas pela empresa”. Após essa constatação, foi pedido novamente ao banco para que todos os documentos da movimentação bancária entre a empresa e o banco fossem disponibilizados. Porém, segundo Bianchi, “o banco se negou a fornecer qualquer outro documento”.
Desde 2009, a Saúde Internacional mantém-se em atividade por força de medida judicial. Segundo Bianchi, caso os valores desviados sejam recompostos, a empresa voltará a ter condições de manter um bom atendimento assistencial aos seus beneficiários, assim como terá condições de se preservar em atividade.
Procurado, o banco disse que não vai comentar porque o processo está em tramitação judicial.
FONTE: Conjur