O Tribunal Regional Federal da 3ª Região reconheceu o direito de uma mulher se submeter ao procedimento de fertilização in vitro a partir de óvulos doados por sua irmã. A 6ª Turma afastou proibição prevista na Resolução 2.121/2015 do Conselho Federal de Medicina, segundo a qual os doadores não devem conhecer a identidade dos receptores.
Para o colegiado, os laços consanguíneos existentes entre as irmãs e o fato da possível doadora haver constituído família tornam remota a chance de qualquer disputa em torno da maternidade.
A autora da ação tornou-se infértil em razão da retirada dos ovários e submeteu-se, com seu marido, a dez ciclos de fertilização in vitro, entre abril de 2000 e outubro de 2007. Após este período, um programa de doação de óvulos do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (USP) foi suspenso em virtude da ausência de doadoras e da evolução das técnicas de congelamento e armazenamento de óvulos.
A mulher então recorreu ao Judiciário solicitando autorização para que o procedimento fosse feito com óvulos doados por sua irmã. Ao analisar a questão no TRF-3, o relator do processo, desembargador federal Mairan Maia, observou que o direito à reprodução por técnicas de fecundação artificial não possui caráter absoluto. Segundo ele, as medidas restritivas só se justificam diante do risco de dano efetivo a um bem relevante.
“A razão maior da proibição inscrita na Resolução/CFM 2.121/2015, ao resguardar a identidade de doador (a) e receptor (a), encontra fundamento ético nos riscos de questionamento da filiação biológica da futura criança, desestabilizando as relações familiares e pondo em cheque o bem estar emocional de todos os envolvidos. Os laços consanguíneos existentes entre as irmãs e o fato da possível doadora haver constituído família tornam remota a chance de qualquer disputa em torno da maternidade, caindo por terra, então, diante da análise da situação concreta, a proibição incerta na norma questionada e a cautela representada pela preocupação que moveu o Conselho Federal de Medicina ao erigi-la”.
A decisão também levou em consideração a avaliação de um médico do Hospital das Clínicas, para quem a obtenção de óvulos de parente próxima agilizaria o processo, pela maior semelhança genética.
O desembargador federal avaliou que a proibição apresentada pela norma e a cautela representada pela preocupação que moveu o Conselho Federal de Medicina não podem ser consideradas diante da análise da situação concreta.
“Se o sigilo é importante para garantir aos doadores de gametas isenção de responsabilidade em face dos deveres inerentes às relações de filiação, sob esse aspecto também não se mostra consentâneo com o caso concreto, no qual a relação de parentesco verificada entre doadora, casal e futura criança caracteriza vínculo do qual decorrem obrigações preexistentes de cuidado e assistência mútua”.
A decisão determina que o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) não adote nenhuma medida ético-disciplinar contra os profissionais envolvidos na intervenção.
Fonte: Conjur