O princípio constitucional que inibe a discriminação entre pessoas também pode ser utilizado nas relações trabalhistas. Dessa forma, o empregado de uma determinada categoria não pode ter tratamento diferenciado de seus superiores no dia a dia da empresa. Seguindo este raciocínio, a 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho indeferiu pedido de recurso de um supermercado e condenou, de forma unânime, a empresa a pagar R$ 20 mil a um trabalhador que tinha sua bolsa e armários revistados ao entrar e sair do estabelecimento.
O recurso da empresa contra a condenação foi examinado pelo ministro Maurício Godinho Delgado (foto). Segundo ele, não se trata de simples caso de revista em bolsas e sacolas, mas de discriminação, uma vez que as verificações eram feitas somente em uma determinada categoria de empregados. De acordo com a decisão, o trabalhador fora submetido a situação vexatória.
Caso concreto
Contratado inicialmente como auxiliar de operador de carnes, o trabalhador afirmou que diretores e gerentes do supermercado não eram submetidos a revistas e entravam na loja pela porta da frente, “enquanto os peões, além das revistas a que são obrigados a se submeter, entravam pela porta dos fundos”. Uma testemunha disse ter visto o gerente determinar uma fiscalização mais rígida sobre o empregado, porque desconfiava que ele tivesse manipulado o inventário.
Segundo ele, a fiscalizaçãoera feita por gerentes e encarregados, na presença de terceirizados, empregados e fornecedores, envolvia o exame do seu local de trabalho, inclusive o lixo, e questionamentos sobre a manipulação de balanço. O preposto da empresa, por sua vez, confirmou apenas a existência de recadastramento de armários para identificar os que estivessem desocupados.
O Tribunal Regional do Trabalho da 19ª Região (AL), que impôs a condenação à empresa, entendeu que esse recadastramento “nada mais é do que um disfarce para revista de pertences dos trabalhadores”. A decisão levou em conta os depoimentos das testemunhas, que afirmaram que os armários eram vistoriados sem a presença dos empregados.
O ministro esclareceu que o princípio antidiscriminatório está presente em diversos dispositivos constitucionais. “Para a Constituição de 1988, não há dúvida de que os princípios, regras e direitos fundamentais constitucionais aplicam-se, sim, às relações entre particulares, inclusive às relações empregatícias”, afirmou.
“Comprovado que as revistas tinham cunho de discriminação, atingindo apenas os trabalhadores mais simples (‘os empregados de categoria de base’), incidem os preceitos constitucionais civilizatórios, com as consequências normativas pertinentes, inclusive a indenização por danos morais”, concluiu o ministro, afastando a alegação de violação legal e constitucional da empresa.
Fonte: Conjur